I Concurso Literário Benfazeja

Ulisses (fragmento)




Poemas de Gabriel Arcanjo.

Somos por vezes
Homens invisíveis
Petrificados em nossa humanidade
Totens contemporâneos
Mitos masterizados
Em novos formatos descartáveis
Ídolos enclausurados
Em redomas de vidro
Heróis desqualificados
Com Carteira de Trabalho e CPMF
Quem chorará nossas tragédias?
Quem rirá das nossas comédias?
Quem em sã consciência
Sacrificar-se-á pela paz no mundo?
Quem voltará a Ítaca
Para empunhar o arco triunfante?
Quem vestirá a armadura invulnerável
De Aquiles?
Quem chorará aos pés da oliveira
E derramará seu sangue?
Acres simulacros
De embelezamentos tecno-lógicos
Complexos titubeantes de Édipo
Modismos co-modistas
Desta nova era de eletrodomésticos de estimação
A des-comunicação
Politica-econômica
Eco
Lógica
Racionalista
Ou realisticamente virtual
A memória falível dos megabytes
As janelas que se abrem para o abismo
Virtual
De palavras banalizadas
Clones cibernéticos
Simulacros simulados no com
Puta dor de última geração
Pulsações des-com-passadas
Dis-simuladas
O Humano cada vez mais obsoleto
Absoluta fibra ótica dos meus nervos
Trêmulos
Tremulantes
Conversas banais em volta da mesa
Cervejas
Hora da novela das seis
Da novena
Depois o noticiário
Anoto no diário: Ouço ruídos lá fora
Vozes de crianças brincando
Olho a cama desarrumada
A casa sem varanda
O rosto do meu pai
Apagando-se da memória
A des-semelhança estampada no espelho
Um livro enigmático na cabeceira da cama
E estas palavras de-compostas
Lado a lado
Dissolvidas
Estilhaçadas
Tateando e tentando
Re-com-por-se
Mas nem tudo está corrompido
Corroído
Poluído
Prostituído
Nem tudo está perdido
Ou inerte para sempre
Nenhum objeto é sem vida de todo
Tudo
Está a espera
De um sopro
Mas
Agora
No fim da tarde
A noite cai
Com todo o seu peso de estrelas
Nem bem
Uma reluziu no céu
Apagou-se
Sobre o negro-chumbo-oxidante
Pingos de chuva ácida
Trovoadas
Nem uma só
Viva-alma
Na rua
Apenas um esquelético cão
Passeando os seus ossos
E o vento
Chafurdando os telhados...



Biografia
Gabriel Arcanjo Rodrigues é poeta, artista plástico e ator-performer, tendo também experiência em direção e dramaturgia colaborativa. Desenvolve há alguns anos uma pesquisa que envolve teatro físico e poesia falada. Trabalhou inicialmente com grupo de poetas “Preto, Branco e Azul Também”, realizando Sarais teatrais nos parques da cidade de São Paulo, no evento “Leitura no Parque” da Secretaria Municipal de Cultura.

Em 1999 fundou o grupo de teatro experimental “Suburbanos” realizando duas performances teatrais: “Poemas de Vida e Morte” (baseado “em textos de Vladmir Maikóvski” e “O Pirotécnico Zacarias” (texto de Murilo Rubião), ambos premiados no projeto “Novos Talentos” do SESI-Paulista. Neste mesmo ano a convite do SESI realiza a performance “Labirintos” por ocasião do centenário de nascimento do escritor argentino Jorge Luís Borges para o evento “Encontro com Escritores” Premiado no sexto e no sétimo salão de Arte Contemporânea em São Bernardo do Campo, realizando duas exposições individuais neste município.

Em 2001 recebeu o prêmio incentivo do projeto “Quarta Mix” do SESI-Paulista com a Performance teatral “Senhoras e Senhores” com texto próprio.

No segundo semestre de 2003 participou do “Núcleo Experimental de Performance” na Oficina Cultural Oswald de Andrade, sobre a coordenação do diretor teatral Francisco Medeiros e da bailarina e professora da UNICAMP Graziela Rodrigues.
Em 2005 realiza o happening “Cartas Para Jovens Poetas” com coordenação do diretor João Petry da UNIRIO na oficina cultural Amanzio Mazzaropi.

Em 2007 participou do espetáculo “Um Minuto de Silêncio” no projeto “Na Casa da Tia Ciata” do CEM (centro experimental de música) do SESC Consolação com a direção teatral de Vadin Nikitin e direção musical de Cacá Carvalho.

Em 2008 realiza a performance “O Reflexo do Espelho na Memória da Casa” para o FENAPO (Festival Nacional de Poesia) realizado em Osasco, recebendo o prêmio de melhor espetáculo e melhor iluminação.

Em 2011 foi convidado para fazer parte da banca de jurados no décimo FECT (festival de curta teatro) de Osasco.

* Créditos da imagem: Wellington Souza
Foto da obra de Auguste Rodin, Muse Tragique - 1890

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