Pedófilo nunca mais, Zeca Martins
Crônica, pelo autor convidado Zeca Martins.
"Pedi para minha mãe comprar dois pirulitos. Um de framboesa e outro de laranja. Na visita seguinte de Laurinha já tinha tudo ardilosamente planejado."
Vou confessar uma coisa que jamais tive coragem de contar. Fui pedófilo por vários anos. Na época eu não sabia que era um fora da lei. Depois de muito esforço consegui abandonar este mau hábito. E hoje, para minha surpresa, vejo que parece que a coisa virou, como vou dizer, coisa de padre. Ainda bem que larguei o vício antes desta prática ficar tão desprestigiada.
E louvo a Deus nunca ter me confessado, senão poderia ter saído da posição de réu para vítima. Quero contar sobre meu tempo de pedófilo. Era muito legal. Eu tinha, sei lá, cinco anos quando me apaixonei pela filha da Ruth, uma amiga de minha mãe. A Laurinha tinha quatro anos. Eu, aquele pequeno pedófilo, sonhava durante a noite com uma libidinosidade assustadora. As imagens eram reais. Eu atracado segurando com carinho safado as mãos da Laurinha.
Se alguém quiser saber o que representava naquela época segurar na mão eu diria que seria algo parecido com um ménage à trois dos dias atuais. A coisa, entretanto, era ainda mais bizarra, pois eu tinha as duas mãos de Laurinha a minha disposição. Mas a parte mais horrenda dessas fantasias noturnas era a troca de saliva. Gostei do sonho e resolvi torná-lo realidade.
Pedi para minha mãe comprar dois pirulitos. Um de framboesa e outro de laranja. Na visita seguinte de Laurinha já tinha tudo ardilosamente planejado. Quando ficamos a sós, saquei os pirulitos do bolso. Abrimos e nos pusemos a chupar. Com um atrevimento desmedido pedi para experimentar o pirulito salivado de Laurinha. Essa é lembrança que trago nessa mente doentia do meu primeiro beijo na boca. E também minha primeira “pedofilada” mais severa. Tenho pena da Laurinha. A Pobre deve carregar traumas profundos até hoje. Sempre penso em pedir desculpas públicas. O problema é concorrer com o Papa.
É muito triste ser pedófilo e carregar esta culpa no coração. Somente fui descobrir que minha pedofilia tinha acabado quando aos dez anos me apaixonei pela Ritinha. Ela era um ano mais velha do que eu. Este depoimento resume minha vida sexual. E o resumo é bem pequeno. Na adolescência tinha perdido meus ímpetos tanto para meninas mais novas como para as mais velhas. Agora queria uma mulher da minha idade.
A busca foi longa. Colégio. Nada. Praia. Nada. Bares. Nada. Balada. Nada. Internet. Bem, aqui algumas coisas deram certo. O problema era de garantia. No colégio, praia, bares, balada eu podia ver o que me esperava. Na praia era o meu local preferido para ter uma noção exata dos contornos.
Agora na internet, quem me garante que a “Loirinha Safada, 20”, não é o Ribamar de 30 anos em busca de um sexo virtual. Eu sempre coloco os meus dados corretos. Bonito, charmoso, magro, esportista, 20 anos. Na minha primeira teclada nesses sites de relacionamento consegui, o que achava, encontrar o meu sonho de mulher.
Virgem, 19 anos, estudante com notas boas, filha de pai rico, desembaraçada, honesta e em busca do primeiro namorado sério. Para completar não fumava, não bebia e não usava drogas. Comecei a desconfiar que exista alguém tão perfeito neste nosso mundo.
Marquei o meu encontro. Ela quis que o lugar fosse movimentado. Escolhemos um shopping. Ela estava atrasada cerca de 20 minutos, pensei:
- Sabia que ela tinha defeito.
Dez minutos depois, chegou a maravilhosa. A descrição do corpo da moça estava errada no site. Ela era indescritível e por isso muito melhor pessoalmente. Conversamos por horas. Estávamos quase apaixonados. Antes que arriscasse meu primeiro beijo, percebi que não tínhamos nos apresentado formalmente, nos tratávamos pelos apelidos do site. ZZ, eu. Lala, ela.
- Qual o seu nome? – perguntei.
- Diz o teu primeiro.
- Meu nome é Aldeberto Zimerman. E o seu?
- Não acredito. Eu sou a Laurinha, filha da Ruth, lembra? A gente se conheceu quando éramos crianças.
Sai correndo sem dizer nada. Laurinha certamente não entendeu o que se passara. Não queria relembrar os meus tempos de pedófilo infântil. Aquilo me fez mal. Mas bem que valia a pena. Laurinha valia tudo.
*
Zeca Martins é autor do livro, De Gênio e Louco Todo Mundo Tem Um Pouco
Facebook.
Twtter.
Créditos da imagem:
A amizade em criança, por Carla Vicente
Zeca Martins: Quem não tem nada agradece por tudo! Esta crônica faz parte do livro publicado na Bookess De Gênio e Louco Todo Mundo Tem Um Pouco. Convido os amigos da Benfazeja a ajudar com a compra da leitura do livro no site. Toda a renda do livro (apenas R$ 4,98 a leitura, mais um pouco de paciência para o cadastro, meio complicado) será doada a ONG Parceiros Voluntários - www.parceirosvoluntarios.org.br. Quem não tem nada agradece de novo por tudo! Obrigado!
ResponderExcluirNão conseguir reprimir meus sorrisos.
ResponderExcluirUm texo muito bem construído, com uma satírica bem
fina e habilidosamente apresentada.
Dez.