I Concurso Literário Benfazeja

Homem de Bem



Conto, por Rosane Tesch.



Quando o Sr. Adalberto foi indicado para consertar um vazamento no banheiro da empresa de Laura ele parecia apenas um bom senhor de olhos entristecidos e cabelos grisalhos, prontos para serem afagados pela compaixão de alguém. A pele riscada por linhas do tempo e ressecada por consequência da profissão faziam dele um homem comum à procura de bicos que lhe rendessem alguns trocados.

Sr. Adalberto sabia vasculhar, remexer, detectar e reparar defeitos, coisas que a uma certa altura da vida ninguém mais quer perder tempo em fazer, principalmente se o trabalho exige terno ou tailleur, se há um importante relatório para entregar, se alguém acabou de fazer as unhas ou se este alguém decide tomar um chopp com amigos.

Antes mesmo que Laura pudesse conhecê-lo, Sr. Adalberto consertou o vazamento, tão simples que não precisou mais que alguns minutos. Ao terminar o serviço, pediu que a chamassem. Com gentil firmeza Laura perguntou qual era seu nome, apresentando-se logo em seguida. Disse-lhe que se soubesse e quisesse aproveitar o tempo havia uma luminária queimada. Laura deixou-o à vontade e com a orientação de que se precisasse de alguma coisa era só pedir que a funcionária a chamasse. Sr. Adalberto pouco falou. Mas Laura não pôde deixar de perceber, através de seus olhos, um certo desdém. Desdém pouco entendido voltou logo aos seus afazeres.

Um reator havia queimado. Esta foi a avaliação do agora técnico Sr. Adalberto.

- Tudo bem! Pode trocar. Foi a resposta de Laura à funcionária que serviu de porta voz do técnico. Segundo sua própria avaliação, ela deduziu que o serviço também seria muito simples e rápido.

Sem a presença de Laura na sala, o Sr. Adalberto tirou a luminária do teto, deixou-a num canto e disse que voltaria no dia seguinte para recolocá-la, quando o reator já tivesse sido comprado.

Laura não pôde senão concordar com a decisão, dizendo que providenciaria o reator para o dia seguinte.

No dia seguinte o técnico não apareceu. Passaram-se dois dias. – O técnico deixou um recado dizendo que estava em um serviço fora, mas que amanhã vem sem falta. Avisou a recepcionista. Não foi. Tudo bem, pensou Laura, ainda precisa receber pelo conserto do vazamento. Foi em cinco.

Para trocar o reator Sr. Adalberto trouxe um assistente. Depois de alguns minutos mais que o conserto do vazamento, Laura entrou na sala para verificar se o serviço já estava pronto. Perguntou se já estava terminando, mas não obteve resposta. Saiu da sala e após alguns segundos ouviu-o chamar a funcionária para avisar que estava terminado. Esperou mais alguns segundos e retornou para verificar a conclusão.

A luz já estava acesa. Sem tocar no interruptor Laura disse que estava tudo ok. Após seu próprio teste de interruptor, Sr. Adalberto mostrou que o serviço estava pronto e que tudo estava funcionando muito bem. Laura repetiu que estava tudo ok.

- Quanto custou o serviço? Perguntou Laura, dirigindo o olhar ao assistente do Sr. Adalberto.

- O preço quem dá é ele. Respondeu um pouco constrangido e inclinando a cabeça em direção ao colega de trabalho.

- O conserto do vazamento está incluído?

- Está sim senhora. Respondeu Sr. Adalberto.

Laura pediu que esperassem um pouco.

Voltou com o dinheiro em uma das mãos enquanto da outra estendia um recibo para ser assinado. Após longos minutos a folha retornou para as mãos de Laura. Enormes, apenas as duas primeiras letras eram fáceis de decifrar. Laura agradeceu pelos serviços e entregou o dinheiro ao Sr. Adalberto, que o recebeu dizendo que se precisasse novamente dos seus serviços era só mandar recado.

Sr. Adalberto, acompanhado pelo assistente, saiu com os ombros um pouco pesados, a cabeça ligeiramente baixa e um leve sorriso nos lábios, sem desdém.

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