I Concurso Literário Benfazeja

Jovenal Maloa e heterónimos



Poemas de Jovenal Maloa (Moçambique)



Jurado de Morte

Como se não ouve-se outra vida
Como se o por do sol não raia-se mais pela manha
Na escuridão e na minha voz homóloga do silêncio defunto

Juízes, talvez julgar-me não me cabe
Muito menos sentenciar vivência expressas em mim

Eu sou, vou é me por e raiar
Chorar nas ruas na beleza solar
Mendigar aflitamente versos fantasmas
Como se a morte estivesse em mim ensaiar o deixar de viver
Loucuras, digo que não há como a um manicómio me comparar

Sanidade, talvez seja o meu paralelo
Loucura jurada eternamente alma da minha demência
Em manhas gémeas dos supostos cadáveres dos meus eus
Mudos, talvez inertes, movidos sem vontade própria

Me reescrevo se sou
Chorar de tristezas
Só se furtar versos de Izidine Jaime e seus heterónimos
Para comparar as ideias que roubo de mim
É de loucos escrever nada
E você achar que muito escrevo…

… Reticência para quem pouco pensa
Mas se pouco a minha mente processa
De onde vêem versos forçados a ser
Ou essa tamanha eloquência?

Justifico o muito reescrito somente por reticências
Elevo manicomiamente ao auge
Orbito levemente na transcendência
Moribundo escritor de um outro ser


Ex-jurado de morte numa outra vida
Defunto desfrutando do raiar do sol
Heterónimos falando no meu silêncio defunto
Fazendo das minhas ideias cobaias
Para saber como matar a perfeição da escrita
Ensaiando o meu deixar de viver.

Arthur Dellarubia (Heterónimo de JOVENAL MALOA

***



Esperança matando a prostituta em mim

Antes que desflores a minha casta
Deixa-me enganar por alguns bens monetários
E faça-me alcoólatra por esta noite como outras madrasta
Que será o meu primeiro trabalho

E que na manha vindoura
A culpa recaia sem dúvidas a bendita garrafa
E os aplausos falsos comunguem os salários da minha desonra
No momento que o meu estômago com a seita cheia desabafa

Antes que me faças dos homens da vida a senhora
Da vida nocturna ausente e insustentável a mulher
Que mates primeiro com o teu dinheiro a minha vergonha
Dai poderes fazer do meu sexo o teu “hobby” fonte de prazer

Mas antes que este pensar se faça real
Vou desacentuar a minha bunda do teu luxuoso carro
Minha língua da tua doce boca sabor a cigarro
E dormir, por que amanha pode a hoje não ser igual.

Lettya Nenny Shantaren (heterónimo de JOVENAL MALOA)

*


Insatisfeita como de sempre, como de antes.

Descasco em mim esta liturgia camal
Já desnuda felina dos desejos fatais
Anja mutuamente bruxa animal
Possuidora de fontes de prazeres iniguais

O seu corpo já perdido no outro
Penando no frio tremulo que queima como fogo
Formando a transcendência da urgia dos loucos
Restando assim eu para que ele peça socorro

Beijos amarrotados de prazeres daquele Romeu
Amparados sem vergonha nos lábios meus
E a cada perdição concedo-lhe a ressurreição
Ejaculando a sua mente com o semblante meu

Que nem sabe ressuscitar o amor
Chamas acesas em nosso quarto
Delirando no gosto do nosso próprio odor
Mas como de sempre o deixa de mim farto

E é ai que eu me liberto só por instante
Faço das minhas, meu próprio amante
Relaxo os pensares masturbantes
E durmo insatisfeita como de sempre, como de antes.

Lettya Nenny Shantaren (heterónimo de JOVENAL MALOA)

***


Muito que ocupa o meu nada

És o muito que ocupa o meu nada
A felicidade que habita em minha vida
És para mim o santo parto do dia
Que nasce no teu olhar, sol
Dona do perfume rosa e do olhar que me guia
És o meu farol

És para mim a viagem que não tem partida
Pretendo mares e exílios ao meu ser
És a cascata que molha o meu
Sonho em varandas de despedidas
Prometendo-me viver o hoje
És o meu amanhecer

És o porto seguro
Perco-me nas ilhas desertas das tuas praias
Por vezes turbulentas
Pois o teu muito ocupa o meu nada
Mas me animo quando se comportas com um navio
E levas todas as minhas mágoas
Com canções no desejo da tua pele perfumada

És mesmo o muito
Que ocupa tanto de nada que existe em mim
E no teu rosto um sorriso
És o muito que ocupa o meu nada
Quando chamas-me de mãe em pensamentos ponho-me a sorrir
Filha minha por vir…

Lettya Nenny Shantaren (heterónimo de JOVENAL MALOA)


**

Ao homem que me fez mulher

Poucas palavras o descrevem
Já que foi curto e grosso na minha criação
Em plena rua quando a minha face era incerta
Os meus sentimentos eram inexistentes
Quando a minha voz era muda
Mas ainda era possuída em muitos actos e pensares

Viu a minha atitude virgem
Em pernas trémulas querendo fugir
Em bocas famintas de beijos justos cuspindo lamentações
E depois de muitas penetrações

Tanto em pensares como em actos
Decidiu chamar-me de Lettya Nenny Shantaren
Na ideia renascida na grites chorando lamentações e injustiça
De sermos mulheres, fracas indefesas, maltratadas
Por este bando de canalhas de maços
Que não aguentam-nos satisfazer e ainda chamam-nos sexo fraco.


Lettya Nenny Shantaren (heterónimo de JOVENAL MALOA)



**

Nas manhas já idosas de uma ex-prostituta

A mini-saia ganga de praia que agora revela sem dó
A nudez agora humilhante do meu corpo
E em lágrimas de felicidades
Que a muito desmaterializaram-se da minha face
Quando a beleza me foi levada com o sopro dos tempos…


Lettya Nenny Shantaren (heterónimo de JOVENAL MALOA)


Crédito da imagem: Olhares.pt
Farol da Beira. Moçambique, por Chico Carneiro

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