I Concurso Literário Benfazeja

A vida entre parênteses




Crônica, por Mariana Collares.



(A vida entre parênteses ocorre enquanto tudo o mais está suspenso. Não são raros os momentos na vida da gente em que sobrestamos um sonho, ou mesmo um movimento, ao alcance de um certo status, ou outro sonho, ou a uma circunstância definida. Falo disso porque me inspirei com uma amiga que está atualmente vivendo entre parênteses enquanto se prepara para um concurso público. Suspendeu compras, amigos, namoros, passeios e se trancou para estudar. Acorda e dorme estudando, sempre de pijamas, que só tira na hora exata em que o trabalho (aquele que paga as contas) a chama. Aí vai lá, faz o que é devido no momento certo e retorna, respirando fundo e sonhando com um fim próximo disso que entende como um “momento”, um “investimento de vida”. E tem razão. Eu mesma já passei por isso e sei que um dia termina. Viver entre parênteses dá um certo cansaço mas também dá à alma um vigor mais do que necessário e a prepara ao que está por vir. E não tenham dúvidas: quando a vida anda de novo, normalmente exige muito mais de nós, que já crescemos. Já houve momentos em que tudo o que queria era voltar para o meu casulo seguro do estudo, quando minha vida era uma sucessão de pijamas e livros. Enfim. Parar a vida, ou ter a sensação de que o movimento está em “stand by” é algo que nos prova. Ou que prova o nosso esforço. Ou a nossa persistência. Ou mesmo a nossa fé. Quantas vezes vi o calor do dia e um sol maravilhoso me chamando para o verão e fiquei lá, no meu cantinho, lendo algo absurdamente maçante e desnecessário? Tudo isso porque confiei, absolutamente, no esforço recompensado - o que afinal ocorreu. O que me faz pensar que viver entre parênteses é suspender o sonho ao seu alcance efetivo, quando corremos atrás do tempo em busca da possibilidade real de vir a realizá-lo. Mas viver entre parênteses só tem sentido quando o esforço é cometido a nós mesmos. O resto é reza. O resto é retórica ou esconderijo. E isso não gratifica. Ao contrário, quando suspendemos a vida tão somente esperando que a divindade nos entregue de presente algo recompensante, e sem esforço algum da nossa parte, estamos é buscando milagres. E milagres não dignificam ninguém, a não ser o milagreiro. O esforço recompensado dignifica o que se esforça. Dignifica o que confiou e não há nada melhor do que a paga após o trabalho. Ainda mais quando é com nosso próprio suor. Então viver entre parênteses só traz ganhos quando o investimento é certeiro: acredita-se nas próprias forças, na própria capacidade, não na sorte, não no acaso. O “trabalhador” transforma o acaso em fato. Vai atrás, pratica, efetiva. Viver entre parênteses é coisa para bom investidor. Pra quem tem coragem e nada de preguiça. O que pára é a vida lá fora. Por dentro a coisa anda, se movimenta, ainda que entre parênteses).


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