Os pés da sereia
Fazer do mar
A cama que transborda.
Do canto um manto.
Pranto e chão.
Paisagem
De azul cobalto
E pedraria vulgar.
Mata-borrão.
No olhar a teia
Dos dias idos
E dos vindouros.
Armistício.
Entrego o ouro
Por memórias de bem-querer.
Ser ou não ser?
Respirar na água, morta.
Tão distante de ser sereia,
Com sua cauda equilibrista,
Cabelo de ondas,
E olhos de encanto.
Abrir comportas
E deixar-se levar.
Lavar com palavra
Os retalhos do existir.
Nas mãos a calmaria.
No peito maremoto.
Inútil
Rosa-dos-Ventos.
Navegar: moto-perpétuo.
Mas posso, ainda, fazer
Da alga desgarrada
(Sargaço boiando em espuma)
Talvez um poema
Sol refletido no quartzo
Vidrado na tez da praia.
Ao invés da cauda,
pé humano.
Invencível
Por todos os caminhos.
Água salgada
E sangue agridoce.
Bordados de escama prateada
E telas de arminho.
Pelo e pelúcia.
Minúcias do não-querer.
Deixo entornar meu cálice.
Peco.
Peço ao oceano
Que se transforme
Em sangue.
E meus cílios de cimitarra
Fatiam enfim a última lágrima
Repartida entre todos vós.
Que o sal dos nossos olhos
Purifique teus odres de vinho.
*
Créditos da imagem: olhares.pt
fera de sol, por butterfly
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