I Concurso Literário Benfazeja

Voz calada na tempestade



O filme já foi exibido naquela sessão que passa à tarde incontáveis vezes, mas não prestara a devida atenção à história. Entrei no escritório, liguei a TV e lá estava: “La Bamba”. O roteiro relata a vida do roqueiro Ritchie Valens, morto em 1959, pouco antes de completar dezoito anos, em um acidente de avião. Fez grande sucesso com "Come On Let's Go", “Dona” e “La Bamba”, conseguiu ganhar dinheiro para dar a tão desejada casa à mãe. Ouviu da moça que amava que era amado também. Por telefone, se reconciliou com o irmão, com quem brigara a vida inteira, entrou no avião e não voltou mais.

Com Ritchie se foram também mais dois roqueiros de sucesso na época:  Buddy Holly e Big Bopper. A data do acidente, três de fevereiro, ficou conhecida para muitos como “o dia em que a música morreu”. Pesquisando um pouco mais sobre o assunto, descobri também que Raul Seixas teria dito que foi “o dia em que o rock bateu as botas”.

Conheço os maiores sucessos de Valens. Escuto-os sempre na rádio, canto, danço. Porém, confesso, nunca havia me ligado neste filme, nem na vida do roqueiro, e na tarde recente parei diante da TV, sem ter noção de que se tratava mesmo de história real. Até agora não sei explicar por que fiquei tão impressionada, chocada até. Mais de uma semana se passara e ainda discutia e rememorava a breve trajetória do rapaz, em conversa na sala de casa.

Talvez seja a história de um sonho o que tenha me deixado tão sensibilizada. Porque sei que foi também uma época de sonho. O garoto tão talentoso - uma promessa, na verdade - saiu de cena ainda criança. Quando vi o quanto ele desejou lá nos idos de 1950 e o legado que nos deixou, fiquei meio sem ação. O cara morreu adolescente e nem imaginava que deixaria sua pequena obra para a eternidade.

Meu filho tem quase a mesma idade. Acompanho o dia a dia de uma cabeça que aspira, de uma vez só, tudo de um mundo que está por vir. Espera um bocado da vida, faz planos, diz que quer realizar muita coisa. É hora de idealizar, de almejar. Penso no quanto se faz aqui, durante a existência, que não se dá importância e que, possivelmente, bem lá na frente, possa servir para alguém, ou ‘alguéns’. Quem vai saber? Como ele, aquele garoto, poderia saber?

Essas histórias de vida me fascinam; divago um tanto, que nem consigo descrever corretamente o que sinto. Queria hoje, mais de cinquenta anos depois, poder dizer a ele o quanto gosto de suas músicas.

Mas, se é concebível dizer que algo é certo, digo: há uma tal sincronicidade entre mim, essa história do roqueiro e o que sinto depois de tudo isso. Não duvido. No momento em que escrevo esta crônica, começa a tocar “La Bamba” na AccuRadio. Peço meu filho pra conferir de quem é a gravação e novamente fico bege: “é o Ritchie Valens. Você me falou dele esta semana”. Era a gravação original, que jamais ouvira antes. Como diria uma amiga, são as sintonias...

Foto:
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