I Concurso Literário Benfazeja

poemas: o pós-biológico



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Poemas, por Wellington Souza.



Os três poemas dessa miscelânea versam sobre o 'confronto' do real e táctil com o virtual, touch. Li, certa vez, o termo ‘relações pós-biológica’ e o termo ficou impregnado, me deixa inquieto até hoje pelo caráter profético e apocalíptico...
*


SIMULACROS

Bits pulsam
em minhas correntes...
                        ...alternadas:
                                               -sangue
                                               -elétrons
                        ...contínuas:
                                               -e continuas aqui,

Bits pulsam e eu
binário
   frio frio frio quente frio quente quente frio quente
   0 0 0 1 0 1 1 0 1

Aprendendo o beabá da máquina
que é o ar do século XXI
é onde nossas palavras atravessam
é o que embaça nossas imagens
e é a resistência que venço até você.
Mas ele
também
retém o seu perfume...
                        ...e é o que desmarcara o simulacro.
                                               -que pulsa
 1 1 1 1 1 1 0 1 0


*
VIRÁ A SER?

Não sei se é bonita,
posto que, quando penso no signo 'Ela'
me vem à mente um clarão acolhedor
que fica;
depois, vai-se ofuscando
e pequenos círculos coloridos dançam nessa brancura
já insossa
até que algo real toma minha consciência
e suscita a aflição de existir.

É a folha ainda não escrita e,
assim como não há uma imagem símbolo
da essência
(única dimensão conhecida pelo poeta),
não há, também, grifos que representem
as sensações que nele se espalha.
Tudo permanece virgem.

Eu não sou o poeta, ele é que é 'eu'.
E esse ser,
vago pronome,
que joga com sua existência (on - off line)
nem sei se existe fora do eu
e deste monitor.
*


SONATA DA CRIAÇÃO


Seu caminhar não abalou o silêncio pré-genesíaco
que dormia.
Aproxima, sorri, senta-se
hálito com hálito.

Toca meu dedo anelar
e o martelo¹,
ainda tímido,
faz vibrarem meu nervos
que soam leve o bastante para embalar o primeiro sol do recém-mundo
e arrepiar-me toda, ali.

Logo taca também o segundo
e o terceiro
e as notas vão regendo as coisas e os seres e o quarto
e a mão
e me faço, enfim
– me faço não; e me fazes
enfim
ser ouvida, vencendo o vácuo e o infinito!

para um instante depois quietar,
esbaforida
– esbaforida não, esbaforidos
de tanto soar e tocar e suar.

Ainda,
antes de partir,
fecha-me a calda e acaricia
de tão leve
que apenas as pontas dos dedos me pulem e me engorduram.
E tudo volta ao pré-genesíaco
e nem ouço teus passos te afastando.

¹martelo: osso do médio ouvido; peça que faz vibrarem as cordas do piano.

*
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Créditos da imagem:
Mundo virtual, por Ana Mokarzel

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