Era apenas um rapaz sentado à frente da minha casa
Crônica, por Giovana Damaceno.
Saía de manhã para o trabalho, na mesma correria de sempre, e ao abrir o portão da garagem dei de cara com ele. Estava do outro lado da rua, sentado no meio-fio, cabeça entre as mãos, uma mochila ao lado.
Olhava para a minha casa, olhava de um lado para outro, olhava para o nada. Apenas estava.
Mas, na cidade, na rotina da violência da cidade, no dia após dia de notícias péssimas pelas ruas da cidade, sem pensar em mais nada, apenas disse: “É preciso tirar a bicicleta da varanda”.
Assim o fiz e fui trabalhar. Isso faz dias.
Costumo remoer o que faço e o que não faço também. E não imaginar outras possibilidades para aquele rapaz me doeu fundo. Era apenas um rapaz sentado à frente da minha casa. Poderia estar ali por qualquer outro motivo que não a intenção de cometer qualquer ato condenável.
Mesmo informada de que ao guardar a bicicleta ele simplesmente sumira, ainda assim, remoí certa culpa. Sou assim.
Pensei em diversas possibilidades: ele poderia estar esperando alguém; seria um deficiente mental e estaria perdido; sofreria de depressão e amargava profunda angústia; um namorado abandonado; marido traído; filho homossexual expulso de casa; desenganado, com alguma doença grave; acabara de ficar órfão de pai ou de mãe; perdera o emprego; seu meio de transporte fora roubado; estaria se sentindo mal; brigara com um amigo e estaria tentando se acalmar; ou simplesmente estava ali. Só.
Nunca mais deixamos a bicicleta na varanda; quando acontece, é bronca certa “vai guardar aquela bicicleta!”, mas o rapaz também não voltou. Sequer me lembro do rosto dele e não me conformo de não tê-lo observado melhor e, quem sabe, até perguntar se não estava precisando de algo.
Mundo mundano corrido azedo. Diria que aprendemos a viver olhando para o próprio umbigo, mas nem para olhar o umbigo temos tempo ou o mínimo de dedicação. Somente vive-se, cumpre-se uma agenda e pronto. Quando se para pra pensar, é tarde.
*Olhava para a minha casa, olhava de um lado para outro, olhava para o nada. Apenas estava.
Mas, na cidade, na rotina da violência da cidade, no dia após dia de notícias péssimas pelas ruas da cidade, sem pensar em mais nada, apenas disse: “É preciso tirar a bicicleta da varanda”.
Assim o fiz e fui trabalhar. Isso faz dias.
Costumo remoer o que faço e o que não faço também. E não imaginar outras possibilidades para aquele rapaz me doeu fundo. Era apenas um rapaz sentado à frente da minha casa. Poderia estar ali por qualquer outro motivo que não a intenção de cometer qualquer ato condenável.
Mesmo informada de que ao guardar a bicicleta ele simplesmente sumira, ainda assim, remoí certa culpa. Sou assim.
Pensei em diversas possibilidades: ele poderia estar esperando alguém; seria um deficiente mental e estaria perdido; sofreria de depressão e amargava profunda angústia; um namorado abandonado; marido traído; filho homossexual expulso de casa; desenganado, com alguma doença grave; acabara de ficar órfão de pai ou de mãe; perdera o emprego; seu meio de transporte fora roubado; estaria se sentindo mal; brigara com um amigo e estaria tentando se acalmar; ou simplesmente estava ali. Só.
Nunca mais deixamos a bicicleta na varanda; quando acontece, é bronca certa “vai guardar aquela bicicleta!”, mas o rapaz também não voltou. Sequer me lembro do rosto dele e não me conformo de não tê-lo observado melhor e, quem sabe, até perguntar se não estava precisando de algo.
Mundo mundano corrido azedo. Diria que aprendemos a viver olhando para o próprio umbigo, mas nem para olhar o umbigo temos tempo ou o mínimo de dedicação. Somente vive-se, cumpre-se uma agenda e pronto. Quando se para pra pensar, é tarde.
Créditos da imagem: Site olhares - fotografia online
a sombra do que eu sou, por Marina Paula.
Não se culpe amiga, pois a correria do dia-a-dia nos faz muitas vezes cometer esse pecado. Desafio a quem em algum momento não tenha visto também sentado no meio fio em frente a sua casa uma pessoa possivelmente naquelas mesmas condições que você tenta advinhar sobre o que você vivenciou. Que isso lhe sirva de lição para na próxima oportunidade (ela certamente virá) voce não deixar de se aproximar e dar um "alô". Lição essa que todos nós deveríamos aprender ao ler sua crônica de hoje. Obrigado.
ResponderExcluirCalino.