O escritor secreto
Conto, por Valentina Silva Ferreira.
Naquela manhã de Setembro, de chuva miudinha, as turmas apresentavam-se aos professores. A turma C do 10º ano preparava-se para a primeira aula de Educação Física. O professor tardava. Os rapazes gritavam as hormonas pelo campo de futebol. As raparigas travavam diálogos de conhecimento.
- Não jogas? - pergunta Luís a um outro rapaz.
Ele suspira e ajeita os óculos à cara. - Não sou adepto desse tipo de actividades. Aliás, eu e a Educação Física não somos bons companheiros - responde, suspirando novamente, como se a vida lhe pesasse na alma.
- Pois… eu também não.
Os rapazes olham-se e trocam um sorriso cúmplice.
- Gostas de fazer o quê, então?
Desta vez, um mirar ao alto. Os olhos tocam no céu, como se pedissem permissão a Deus para responder àquela pergunta. - Escrevo. Todos os dias, sempre que me apetece.
Luís abre a boca, sem dar por isso. Finalmente, alguém que compartilha o seu gosto pela escrita.
- Escrevi um livro e consegui uma editora que o publicasse - murmura baixinho.
- Uau! - exclama Luís. Queria ser escritor. Poder ver as suas obras expostas nas bancas de livrarias conhecidas era um sonho mais antigo que o seu próprio nascimento. No entanto, e apesar de escrever muitas vezes, ainda não tinha nenhum livro escrito. - É sobre o quê? - pergunta, fascinado com aquela presença quase divina, à sua frente.
- É sobre acreditarmos em nós próprios, nas nossas capacidades e atributos. É sobre acreditarmos que, aliada às nossas qualidades, está uma entidade que nos guia e protege e que, crendo piamente na sua existência, ela nos ajudará a alcançar tudo aquilo que pretendemos.
- É sobre religião, então?
- Se assim o quiseres chamar - responde, olhando para dentro dos olhos de Luís. - E tu? Também gostas de escrever?
- Adoro. Mas ainda não tenho nenhum livro. Ideias não me faltam mas não sei se valerá a pena perder tempo a escrevê-lo para depois ficar guardado numa gaveta.
- Escreve! Não penses nos ses. Acredita em ti, no que tens dentro de ti e escreve. Não destines o teu destino sem ele estar sequer, ainda, destinado. Nunca desistas!
E com estas palavras, o toque de saída soou. O professor não aparecera. Despediram-se e Luís foi para casa. Escreveu sem parar e foi feliz assim. O outro rapaz? Bem, esse nunca mais apareceu.
*
Créditos da imagem: Site olhares - fotografia online
As sombras de uma conversa, por Pereira Lopes.
Oi Valentina,
ResponderExcluirLindo conto! Todos nós que escrevemos, começamos muito timidamente como se escrever fosse coisa para loucos. Escrever é amelhor das loucuras!
Beijos
Leila
Adorei seu conto Valentina. Traz uma mensagem super-bacana. Parabéns. Bjs!!!
ResponderExcluirValentina,
ResponderExcluirme identifiquei com o personagem e adorei o conto. Parabéns!
Clarissa.