I Concurso Literário Benfazeja

Um Ágora Brasileiro



Crônica de Libério Lara!

Às vezes eu gosto de sentar numa praça e observar as pessoas que passam, junto com o tempo. Confesso que sinto vontade de sair falando, como Sócrates fazia nos Ágoras. Mas eu não tenho nada a ensinar. Quando muito, consigo aprender com as pessoas que me ensinam, sem se aperceberem disto.

Nesta semana eu sentei-me num dos banquinhos da Praça da Assembléia, aqui em Belo Horizonte. Às vezes faço daquele canto meu Ágora, onde cismo comigo mesmo, toda sorte de devaneios e inquietudes nas quais navegam meu coração e minha mente.

No banquinho de madeira logo ao lado do meu, ouvi dois moradores de rua papeando, enquanto produziam algum tipo de artesanado:

_ Rapaz, ninguém passa fome nesse mundo mais não! Você pode ir pra qualquer capital do Brasil, que se tiver um tiquinho de disposição, descola pelo menos pro rango... fácil, fácil!

_ Você não viu ontem, mano! Eu tava zerado. Corri ali pra Álvares Cabral e descolei vintão, rapidinho. Em meia hora lavei dois carros! Minha bóia e minha cachaça eu salvei...

_ A gente ta precisando arrumar é um buraco mais da hora pra entocar, acha não? O negócio ali ta sinistro, irmão!

_ Que nada, mano! Eu to pensando é cair no mundão de novo! Essas paradinhas aqui que a gente faz, vende demais no litoral! Bora pro nordeste? Tirar onda com as gringas e tal...

Eu estava tão mergulhado naquela conversa que demorei pra notar a presença de um senhor, que sentou-se ao meu lado. Roupas simples, óculos de grau, segurava uma mochila no colo quando disse:

_ Faz frio, faz calor... quem entende esse tempo?

_ Pois é... só este ano a gripe me pegou duas vezes...

_ Cheguei aqui cedinho, vim ter com meu chefe ali. Mas disseram que ele vai aparecer só à tarde... vou esperar, não é? Vim de Manhuaçu só pra resolver um problema com ele. Sabe do que estou falando?

Não, eu não sabia...

O senhor continuou:

_ Na hora de pedir voto, vai pra cidade da gente e promete de um a tudo! Eu fiz minha parte, agora eu quero o meu. Sou esperto, menino! Ninguém me faz de bobo não. Dei meu nome pra ele, RG e tudo. Agora eu quero o meu...

_ Entendi...

_ Ó, este aqui é irmão deste! ele disse, mostrando os olhos atrás dos óculos de grau._ O assessor disse que ele chega de tarde. Estou só esperando meio-dia. Meio-dia pra mim já é de tarde. Não saio daqui sem o meu. Ah, não saio mesmo...

É... por essas e por outras, o Brasil ainda é o país do futuro. Passei os olhos pelas páginas de um livro, enquanto ele continuou:

_ Quer saber? Sou bobo nada! Depois o deputado chega antes do combinado e vai embora sem ter comigo! Sou bobo não! Vou sentar a bunda lá na cadeira da sala dele e não arredo o pé enquanto ele não aparecer. Bom dia aí pra você... sou bobo?

Não contive o riso, observando seu andar claudicante. No banquinho onde os moradores de rua conversavam, percebi um casal.

_ Mas olha que coincidência! Tem uns dez anos que a gente não se vê, uai!

_ Não é mesmo? Eu casei, meu marido já me largou. Agora to com a minha filha sozinha. Lembra dela? A Bruna. Naquela época ela tinha cinco anos... está uma moça!

_ Eu passei um bom tempo em São Paulo e voltei. Vida dura lá!

_ Olhe, estive em São Paulo no Consulado, tentando visto pra Bruna ir pra Disney, mas não consegui não...

_ Ah, sei! O Netinho é dono lá...

_ Netinho?

_ É, aquele cantor de pagode...

_ Dono de onde?

_ Do Consulado, uai...

_ Ah, é? Sabia não...

Nem eu... não falo que tenho muito o que aprender?



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Créditos da imagem: Olhares.com
Banco da Praça, por Daniel

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