I Concurso Literário Benfazeja

Contos Fantástico: Zumbis


Contos sobre zumbis na seção de contos fantásticos.

Veja os temas para os próximos meses e como enviar o seu conto!


Amo-te.
por Leandro Luiz

Essa é uma história de amor que começou dentro de um cemitério. Convenhamos que não é lugar nada convencional para se engatar um romance, se não fossem por alguns pequenos detalhes: ele é um zumbi e, ela, uma vampira.

A nossa querida sanguessuga chama-se Charilleynne, uma mulher extremamente linda, inteligente e muito sensual. Completou recentemente 653 anos de idade, mas quem não a conhece jura que ela aparenta ter bem menos. Uns 600, tranquilamente.

Além de aguentar a maldição de um nome tão complexo de se soletrar, a nossa querida vampira sabe que está condenada a passar o resto da eternidade na imensidão da escuridão, sem esperanças, escolhendo vítimas inocentes para saciar a sua sede por sangue.

Um infeliz carma que, mal sabia ela, seria aliviado por uma intensa paixão. E isso aconteceu enquanto ela escolhia flores das sepulturas para decorar o seu caixão.

Distraída no cemitério, escutou um forte barulho vindo de uma cova ali por perto. Saiu correndo com a curiosidade de saber o que era. Chegando lá, ficou entusiasmada com o que encontrou.

Robson era um morto-vivo diferente de todos o que ela já tinha visto nos últimos 500 anos. Sua pele apodrecida e o seu cheiro forte despertavam um sentimento desconhecido naquela mulher.

O zumbi galanteador também ficou encantado com a musa das trevas. Rastejou até ela como se quisesse dizer alguma coisa. Não conseguiu.

“Ele deve ser tímido demais”, imaginou ela. Eles se encararam por alguns instantes. Charilleynne sorriu. Ele gemeu. Ela se aproximou e disse um tímido “oi”. Ele gemeu novamente.

Foi o suficiente para Charilleynne descobrir que Robson era, definitivamente, o homem da sua, digamos, vida.
Começaram a namorar, casaram-se e, o que era para ser literalmente uma eterna lua de mel, de um ano para cá, está virando um inferno.

Charilleynne reclama pela falta de atenção. Robson a acha fria demais. Ele quer sair de dia. Ela, à noite. “É por uma questão de sobrevivência”, grita ela sem sucesso. Robson não quer compreender nada, por mais que tente.

O interesse que um tinha pelo outro já não é o mesmo. Charilleynne até tenta esquentar a relação no seu momento mais íntimo, mas não tem jeito. Robson só pensa naquilo: em comer cérebros.

Leandro Luiz,
31 anos, publicitário e, nas horas vagas, escreve sobre tudo, todos e o que acha ser interessante. Entre seus trabalhos literários, a obra "Vamos fazer compras?" foi eleita pela Academia Jundiaiense de Letras uma das melhores crônicas da cidade de São Paulo, em 2011.

Blog | @Facebook



Acossado
Eduardo Ribeiro Toledo

Sempre tive a sensação de estar sendo acossado, por um ente fantástico, que se usa da minha casa, vagueia pelos cômodos e macula meu ego e o dos meus visitantes. Mas, não os vejo. Nunca fui muito de ver fantasmas. Dizem que bebo e fumo demais e, por isso, estaria à mercê deles. Sem saída e sem olhares, contra verdugos que me acossam e me deixam ciente de suas presenças, nada posso. Eu nem me importo. Respondo-lhes que já foi a minha hora.

Minha mãe ficou maluca ou, como dizem outros, melhores do que eu, esperta. Depois de aposentada, ela criou um espaço para gatos abandonados na rua. Recolhia qualquer felino. Toda a família foi contra: ora, uma velha, que agora resolveu cuidar dos gatos abandonados e gastar dinheiro com isso? Ao menos não eram os pombos, tadinhos, os tais ratos que voam. Ela não deu importância aos comentários da família. Quis dar de São Francisco; e, o resto, que se dane.

Acompanhei minha mãe um dia em seu gatil. Eu conservava, durante o trajeto, a inarredável sensação de estar errado ao incentivar a minha mãe, naquela mania insidiosa. Pegar gatos abandonados na rua? Trocar seu carro por um carro pick-up, a diesel, ao destino do seu servir aos gatos soltos escolhidos? Fechei meus olhos e esperei chegar ao local.

Eu sempre gostei de gatos, sempre tive gatos. Como disse Da Vinci: o menor felino é uma obra-prima da natureza. E, assim, ao chegar ao gatil, fui-me interagindo com os bichos. Um bando de gatos desgraçados: velhos, sem pelagem, doentes e feios. Mas o que eu poderia esperar dessa função materna? Com filhos criados, sobraram os gatos para cuidado materno.

Entretive-me com os filhotes. Todo mundo adora os filhotinhos dos animais domésticos. São tão fofos, que nos esquecemos de quando eles crescem. E adotamo-los. E criamo-los. E nos arrependemos depois. Ou não. Depende de cada espírito humano.

Minha mãe me entregou um punhado de biscoitos, brinquedos e essas coisas que os gatos gostam de brincar. Pensei que iria me divertir. Tal como uma luz laser a fazer a perseguição coletiva dos gatos no chão. Só que, desta feita, eu seria patrão, a comandar a brincadeira.

Dirigi-me a três filhotinhos, bem pequeninos. Filhotes, repito, são bonitinhos. Escolhi as guloseimas que mais lhes apeteceriam. Quem tem gato sabe: são loucos por biscoitos. Eu queria, na verdade, ter uma fatia de presunto. Eu, que já tive gatos, sei o perfume no ar da fatia de um presunto.

Posso-lhe dizer que com biscoitos de gatos, ou fatia de presunto, nenhum dos filhotes me deu atenção. Tenho um jeito típico de chamar o interesse dos felinos, mas nada funcionou naquela hora. E pensei: que bando de gatos abandonados seria esse, que não me atendem na melhor conveniência?

Todos eles olhavam para o teto, desconsideravam minha oferta. Todos eles viraram a cabeça da esquerda para a direita, em direção ao local de saída do gatil. Eu perguntei: “- Mãe, esses filhotes não querem biscoitos, estão malucos?”. Ela olhou a ocorrência e me respondeu, como se fora um pajé indígena: “– deixam-nos afastarem os zumbis primeiro, porque esses queridinhos tomam conta da casa; depois, você poderá se divertir...”.

Eu que não sou rato, mas já tive gatos, lembrei-me: trata-se do sentimento do fantástico de Cortázar. Qualquer zumbi não entra naquele gatil, porque os desgraçados, velhos, filhotes, os sem pelagem, doentes e feios tomam conta daquela casa.

Eduardo Ribeiro Toledo
Participou da antologia "Rioinversos" pela Confraria de Autores.

Participou da antologia "Poemas de Outono" pela Confraria de Autores.

* A Confraria de Autores, à semelhança da Sapere, também é um selo editorial da Editora Mar de Letras.

Autor do prefácio do livro do poeta Wender Montenegro "Livro-Arbítrio", pela Rubra Cartoneira Editorial.

Colaborador do website "Observatório da Imprensa" e da revista "Suplemento Trabalhista" da Editora LTr.

@Facebook

Créditos da imagem: Olhares.com
Zumbie!, por ElielSouza

Um comentário: