I Concurso Literário Benfazeja

Crônicas de Rose Bonifácio





Abismos

O cheiro de café em suas mãos inebriava os pensamentos, invadia docemente as narinas e aflorava até os anseios mais adormecidos. Seu gosto era peculiar! Parecia que sempre precisaria de mais uma colherada de açúcar pra está no ponto. Seu toque era quente! Daquele que arrepia e gela antes de queimar. Sua fala era suave! Parecia que pra ele era mais importante ser sentido do que ouvido. Porém eu, caro leitor, sempre fui morna. E, surpreendentemente, este turbilhão de sensações deixava-me febril, em êxtase, e a beira de um abismo com os nervos fervilhando e uma vontade dos diabos de pular, mas, como disse antes, sempre fui morna e todos que possuem essa característica recuam! O medo me fez perceber a verdadeira dimensão da queda e que esta seria dolorosa pra quem não tivesse asas. Então, fui convencida que recuar era o certo a ser feito. E logo, o cheiro do café foi desaparecendo, o gosto ficando amargo, o toque esfriando e a fala apenas sendo ouvida pela obrigação de ser. Naquele instante, a certeza que saltar era só um delírio foi tão absoluta que até o abismo sumiu!




Não há mais brilho!

Gostava de olhar o céu à noite. Na verdade, gostava daqueles pontinhos brilhantes e solitários que mais tarde ensinaram-me a chamar de estrelas. Quando criança deitava-me na calçada e as observava por horas com a típica admiração infantil. Não existia nada mais divertido e/ou interessante. Havia algo nelas que prendia a minha atenção de tal forma que esquecia-me de o quão distante estávamos, e então, como de um súbito rompiam a linha tênue que separava o que era real do que era fruto da minha imaginação, e podia tocá-las e senti-las queimando minhas retinas com aquele brilho arrebatador e impiedoso. Era transcendental!

Contudo, o tempo passou, e eu cresci! Hoje, não consigo vê-las. O brilho das luzes aqui embaixo tornou-se a cada dia mais intenso, e no fim, fizeram-me o que jamais nenhuma estrela foi capaz de fazer, cegou-me!




Divagações sobre o céu

Já paraste pra olhar o céu? O jeito que as nuvens se fundem e desfazem-se em total sintonia? É lindo! Eu costumava querer ser nuvem e desfazer-me em pássaros e fundir-me ao vento. Porém, descobrir o mar. Já reparaste no jeito em que as ondas quebram na praia e depois voltam ao fundo do mar e tranquilas refazem-se? É inspirador! Então, passei a querer ser mar, na verdade, ser onda. Quebrei-me e refiz-me diversas vezes até perceber que nem todos nasceram fortes o suficiente. Por fim, quis ser águia! Já percebeste o quanto são perfeitas? Voar é libertador! Sobrevoei as nuvens, cortei o vento e molhei minhas asas nas ondas. E nunca, durante todo meu ser ave desejei ser outro ser. Nunca mais mar, nunca mais céu, conseguir voar! Já reparaste o quanto é incrível? Quando conseguir ver, não desejará ser mais nada. E então, o vento estará soprando em seu rosto e lhe sussurrando que já achaste o que passaste a vida a procurar.




Rose Bonifácio
Escritora na empresa Blog Disritmias Literárias
Disritmias Literárias


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Créditos da imagem: (pode deixar que eu preencho isso)
O Céu é uma linha imaginária, por Bruno Costa

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